Círculos (a partir) de Paulo Freire

Autoria desconhecida [Unknown authorship]. Nômades em Círculo de Cultura no Quênia [Nomads in a Culture Circle in Kenia], 1975. Impressão sobre papel fotográfico [Photographic print]. Coleção [collection]: Instituto Paulo Freire
Autoria desconhecida [Unknown authorship]. Nômades em Círculo de Cultura no Quênia [Nomads in a Culture Circle in Kenia], 1975. Impressão sobre papel fotográfico [Photographic print]. Coleção [collection]: Instituto Paulo Freire

Em 1963, no Brasil, analfabetos não possuíam direito a voto. Num contexto político extremamente tenso, que levaria ao golpe militar do ano seguinte, foi realizada em Angicos (Rio Grande do Norte) uma experiência de alfabetização de adultos liderada por Paulo Freire. A ação contou com a presença do presidente brasileiro e teve enorme impacto midiático dentro e fora do país. Isso se justifica pelos números surpreendentes que circularam na época: em 40 horas cerca de 300 adultos haviam se alfabetizado. Para além da eficiência do método, Freire entendia a pedagogia como parte de um processo de formação para romper o que ele mais tarde chamaria de “cultura de silêncio” – aquela que impede os sujeitos de exercerem sua autonomia intelectual e política.

Por anos antes da experiência de Angicos, Freire se dispôs a colocar em suspensão seus saberes para estar em franco diálogo com educadores, educandos, jovens, mães, pais e gestores de contextos pedagógicos os mais variados. Nesse intercâmbio (ou como forma de intensificá-lo), Freire adotou uma forma primordial como chave para a experiência da educação e da autonomia: o círculo. Primeiro, ele propôs Círculos de Pais e Professores tanto em escolas precárias de Recife (como aquelas improvisadas na zona paroquial de Casa Amarela) quanto em unidades da rede de escolas do sesi – era uma forma de convocar os tutores familiares e escolares para discutir em um espaço sem hierarquias toda sorte de problemas e cativar o compartilhamento de responsabilidades e saberes. Depois, concebeu os Círculos de Cultura, uma alternativa à organização espacial da sala de aula tradicional em que os educadores atuavam como facilitadores e provocadores de conversas que se pretendiam horizontais e que abordavam diretamente a realidade dos educandos. Era nesse contexto que eram anotadas as palavras geradoras que seriam usadas para a alfabetização e era nele também que imagens e palavras eram apresentadas e discutidas durante a alfabetização propriamente dita.

De certa forma, pode-se dizer que o gérmen para a dinâmica pedagógica que alguns tratam como libertadora e outros como ameaçadora tem sua forma síntese nesse círculo de pessoas sentadas em roda. Algo tão simples, que naquela década de 1960 foi adotado também como premissa para experimentações teatrais. E, tão intuitivo, que seres humanos o praticam desde tempos imemoriais ao redor do fogo ou do alimento. Algo, por isso, que se evoca aqui em meio a obras de artistas que, cada um a seu modo, também procuraram suspender seus saberes para estar em contato com outrem. As concepções de dialogicidade e de autonomia estão no centro de uma das práticas de mediação, que será realizada a partir de círculos de conversa sobre a exposição. O objetivo dos círculos é a construção coletiva de sentidos possíveis para o encontro com as obras e para as relações entre elas, partindo da realidade dos sujeitos e refletindo-se nela.




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  1. Caroline A. Jones, Eyesight Alone: Clement Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).
  2. Greenberg’s Modernism and the Bureaucratization of the Senses (Chicago: University of Chicago Press, 2005).
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